domingo, 26 de julho de 2020

Sobre substancialismo e procedimentalismo

            O papel do Poder Judiciário tem se modificado, sobretudo desde meados do século XX. Dentre as inúmeras discussões e interpretações para entender e definir o papel desse poder (e da própria Constituição) nas democracias contemporâneas, existem as que tratam das teorias susbtancialistas e procedimentalistas.
            Para Ana Paula de Barcellos (In: Neoconstitucionalismo, direitos fundamentais e controle das políticas públicas. Revista de Direito Administrativo. Rio de Janeiro, n. 240, p. 87-88, abr./jun. 2005), o substancialismo
“sustenta que cabe à Constituição impor ao cenário político um conjunto de decisões valorativas que se consideram essenciais e consensuais. Essa primeira concepção pode ser descrita, por simplicidade, como substancialista. Um grupo importante de autores, no entanto, sustenta que apenas cabe à Constituição garantir o funcionamento adequado do sistema de participação democrático, ficando a cargo da maioria, em cada momento, histórico, a definição de seus valores e de suas opções políticas. Nenhuma geração poderia impor à seguinte suas próprias convicções materiais. Esta segunda forma de visualizar a Constituição pode ser designada de procedimentalismo.
                       Já Lenio Luiz Streck (In: Jurisdição constitucional e hermenêutica: uma nova crítica do direito. Porto Alegre, Livraria do Advogado, 2002.p. 141) sustenta que
“a corrente substancialista entende que, mais do que equilibrar e harmonizar os demais Poderes, o Judiciário deveria assumir o papel de um intérprete que põe em evidência, inclusive contra maiorias eventuais, a vontade geral implícita no direito positivo, especialmente nos textos constitucionais, e nos princípios selecionados como de valor permanente na sua cultura de origem e na do Ocidente. Coloca, pois, em xeque, o princípio da maioria, em favor da maioria fundante e constituinte da comunidade política.”
            O que se nota é uma diferenciação clara sobre o papel que a Constituição Federal deve assumir em determinado ordenamento jurídico, o que causa reflexos na própria atuação do Poder Judiciário, eis que cabe a ele assegurar a efetividade desse ordenamento, caso violado.  Pode-se dizer que a corrente procedimentalista privilegia as regras do jogo democrático, no sentido de que pressupõe uma esfera pública bem formada, na qual seus atores desfrutam de iguais condições de participação. Advoga, então, a tese de que cabe ao Judiciário assegurar que essas regras procedimentais sejam cumpridas.
            Já a corrente substancialista parece dar mais força ao Judiciário, pois coloca também em suas mãos a tarefa de assegurar direitos, inclusive e, sobretudo, os fundamentais. Mas é claro que algumas questões se tornam sensíveis quando passamos a analisar a realidade. Isso porque verificamos muitas vezes o exercício da jurisdição de modo ativista, aqui entendido como uma patologia da atividade jurisdicional, isto é, como um posicionamento voluntarista e casuísta, capaz de colocar em xeque a legitimidade do Poder Judiciário.
            Logo, muito mais do que definir se e qual das correntes podemos verificar no Brasil, precisamos é investigar e delimitar o núcleo legítimo de atuação do Poder Judiciário, assunto para o qual dedicaremos outra coluna deste Blog.

Sobre Judicialização da Política, leia AQUI.

Nairo Lopes

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